1. O Princípio da Regência
Na História da Antiguidade
Na Antiguidade um Princípio de Regência devido a uma ordem natural universal era intrínsecamente dado junto às concepções éticas e políticas das monarquias, ou Principados:
O modo de regência monárquico não era dado criticamente, por si mesmo, mas apenas conforme os termos valorativos:
1) O Príncipe ama seu povo, ou não; Ele é amado pelo povo / ou não;
2) Comanda bem seus generais e soldados / ou não;
3) Tem sabedoria administrativa, ouve os conselheiros e conhece seus país / ou não;
4) O Príncipe governa segundo a Lei Divina / ou não...
Também na China: Confúcio e Taoísmo. Ordem natural e ordem histórica pertencem a um mesmo contínuo de pensamento.
Na continuidade desses valores antropológicos, em Esparta [séc. V aC] um regime comunista semelhante ao da União Soviética foi instalado. O resultado foi uma grande superioridade militar, que derrotou o regime de repúblicas atenienses, que eram oligárquicas. Em Atenas, as repúblicas eram sucedidas por períodos de curtos principados, onde os “tiranos” poderiam significar novos líderes “libertadores do povo”... Ou não – sendo novamente substituí-dos por repúblicas instáveis, etc.
O Senado Romano era um mistura monarquia-república. Os Senadores eram conjuntamente chefes-de-estado aristo-cráticos, porém certos rituais republicanos de eleições eram observados. Com o tempo [c. 150 aC], um Parlamento Popular foi estabelecido.
Quando Julio César comanda a derrota do regime do Senado, e se instala como Príncipe, ele é visto como chefe-libertador, e não como “usurpador” de uma República Senatorial falida. Nesse sentido ele é comparavel ao Lênin da revolução de 1917.
No séc. II dC, cinco reis denominados “Antoninos” foram reconhecidos como Príncipes Esclarecidos em Roma: estáveis, cultos, aceitos pela sociedade nas várias classes.
Dom Afonso Henriques
A Reconquista e a Fundação de Portugal
A Reconquista na Hispânia das terras conquistadas pelos Mouros se inicia com Fernando I, de Leão e Castela, que reinou entre 1037 e 1065, e fez a tomada de Coimbra em 1064. Afonso VI foi seu sucessor (1065-1109), que atingiu a linha do Tejo em 1085, conquistando Toledo, antiga capital dos Visigodos. Os Cristãos conquistam Santarém e Lisboa em 1093, mas perdem essas cidades em seguida, com a chegada dos temíveis guerreiros Almorávidas, convocados pelos Mouros desde o Norte da África. A contra-ofensiva muçulmana faz com que Afonso VI peça ajuda aos cavaleiros cristãos do Sul da França: à Abadia Beneditina de Cluny, e ao Duque de Borgonha, sendo Afonso VI casado com a filha deste duque.
Filhos de nobres da Borgonha, os jovens cavaleiros Raimundo e Henrique vieram à Espanha buscar sua fortuna. Raimundo se casou com uma filha de Afonso VI, e herdou o condado da Galícia. Henrique se casou com outra filha de Afonso, e herdou o condado de Portucale (1096). Sendo falecidos Raimundo e Afonso VI, e com o falecimento de Henrique em 1112, seu filho Afonso Henriques se torna o herdeiro natural do condado de Portucale, sendo ainda uma criança. Sua mãe Teresa assume a regência.
Em 1127, com 18 anos, Afonso Henriques participa da resistência em Guimarães contra as tropas do novo Rei de Castela, Afonso VII, que exigia que sua soberania fosse reconhecida pelos portucalenses. A vitória em Guimarães marca efetivamente a independência do condado em relação a Castela. Em 1128 (19 anos) lidera a rebelião dos nobres locais contra Teresa, que se associara ao clã dos Trava, da Galícia, que pretendiam submeter Portucale ao Condado da Galícia. Esta data, que marca o início de seu Reinado, é a data de nascimento do novo Reino Portucalense.
Afonso Henriques se revela um chefe-guerreiro incessante e memorável: incansável na recuperação dos antigos territórios célticos e visigodos, distribuindo as terras conquistadas entre colonizadores, recebendo apoio e emigrantes de várias frentes da Reconquista Cristã e da França.
Em 1131 ele desloca sua corte para Coimbra, na fronteira em que o Rio Mondego separava as províncias cristãs dos reinos mouros, o que indicava sua intenção de expandir seu antigo condado. Nos anos 30 Afonso Henriques faz incursões em território mouro, fundando o Castelo de Leiria, e vencendo tropas mouras em Julho de 1139 na Batalha de Ourique, que se tornou lendária. O novo príncipe portucalês teria tido uma visão celestial, o que indicaria a visão do Cristo a lhe abençoar as campanhas militares. Esta batalha se tornou a fundação mitológica do Reino de Portugal: Afonso Henriques se auto-intitula Rei dos Portugueses.
Conquista Santarém (Rio Tejo) em 1147, depois de uma tentativa frustrada de tomar Lisboa em 1142, que permanecia um grande centro de poder e cultura islâmica. Afonso Henriques vê na passagem de uma frota que descia da Europa do Norte, para combater os mouros em Jerusalém, uma oportunidade para a conquista de Lisboa. Oferece aos cruzados benefícios na forma de direito de saquear a cidade uma vez derrotada, ou de se fixarem em territórios que ele doaria. O cerco a Lisboa foi doloroso e durou de junho a outubro de 1147, com conflitos entre as hostes cristãs de portucalenses e dos cruzados, pois a estes últimos só interessava o saque. Vencida a grande capital, o Rei dos Portugueses toma iniciativas de povoamento nas terras férteis do Tejo. Cavaleiros flamengos e francos recebem incontáveis doações de propriedade e senhorio, o que continua durante o reinado do seu sucessor Sancho I. Entre outros, o Mosteiro de Alcobaça (1153) teve papel de destaque no povoamento, desenvolvimento agrícola, e produção para o mercado. Alguns monges eram templários, cavaleiros religiosos em combate ao Islã.
Afonso Henriques continua chefiando incursões militares no norte, e no sul, até ser ferido na perna e derrotado na Batalha de Badajoz em 1169, quando chega a ficar preso pelo Rei de Castela. Reina até os 76 anos, tendo seu filho Sancho como sucessor em 1185.
Península Ibérica circa 560 dC
2. O Republicanismo
História Moderna desde final Séc. XVIII
O Republicanismo desde meados do séc. XVIII. Ética e Filosofia dos Iluministas.
2.1. A concepção política dos Iluministas era a de que as monarquias seriam intrinsecamente despóticas, sempre tendo o povo sob “dominação”... O Republicanismo seria a resposta ética natural: O Parlamento e o Executivo sob eleições; os eleitores como cidadãos independentes e esclarecidos. O Executivo com ministros indicados pertencentes aos partidos eleitorais; Judiciário autônomo, imprensa livre, etc.
O peso moral de algumas décadas de pregação republicana no séc. XVIII (na França) resultou na revolução de 1789. Esta revolução, que pretendia instaurar uma república burguesa, termina em retumbante fracasso.
A ascenção de Napoleão sugere um sub-consciente na sociedade, e uma nostalgia popular (de soldados que o seguem), de um Princípio de Regência, na forma monárquica da antiguidade. Napoleão faz acenos à burguesia, tentando às vezes se comportar como burguês... Também seu regime vai se tornando caricato, até ser destronado, mas o princípio monárquico que reinstaura a dinastia Bourbon em 1818, agora é explícito.
Em 1830 a monarquia Bourbon é substituída pelos de Orleãns, que obtém certa estabilidade política, com um regime que tenta manter um “acordo-de-classes”, entre povo, burguesia, aristocracia feudal.
A forma monárquica que equilibra politicamente as três principais classes da sociedade, foi conhecida pela primeira vez, na história da Europa, com o advento da dinastia Aviz em Portugal, a partir de 1385.
O Cesarismo e Napoleanismo seriam como um reinício histórico “do ponto zero”: na medida em que as repúblicas ou principados fracassam, exatamente por não serem capazes de obter o “acordo-de-classes”.
2.2. Na forma dos assim chamados Socialistas Utópicos, a república burguesa apenas precisaria ser reformada por atos de “boa-vontade”, sinceros, democráticos, cristãos, para se atingir a estabilidade social.
Pode-se argumentar que a questão da “igualdade democrática” não é o que estaria em primeiro plano, mas a questão de uma redistribuição, a qual possa permitir no futuro alguma maior “igualdade social” – no sentido de uma equivalência cívica e jurídica.
Esta redistribuição é um ato de regência, ato governamental de um estado-república pleno. Porém, também poderia ser feito por uma “monarquia esclarecida”.
2.3. Nos anos 1860, 70 e 80 Marx, e Engels até os anos 90, entenderam que não seria necessário um “rompimento” da ordem burguesa-republicana, com a “ascenção do proletariado”. Aquilo que se convencionou chamar de Blanquismo... Isso devido ao fracasso das revoluções de 1848, e da derrota em 1871 da resistência em Paris.
Todos os socialistas entendiam que poderiam haver “reformas”, e melhor consciência política dos trabalhadores, em se mantendo os termos republicanos vigentes, parlamento, partido organizado, jornais, etc.
A revolução de 1917, liderada por Lênin, leva a um paradoxo, porque do ponto de vista da propaganda burguesa ocidental, ele seria um déspota: O Leninismo surgiu como doutrina da “ditadura do proletariado”, que havia sido abandonada desde as revoluções do séc. dezenove.
Porém, para seus seguidores, ele é um tipo cesáreo, ou napoleônico: sua ditadura do proletariado é vista como fato social, a questão é “contra quem”, e a “favor de quem”, seu autoritarismo se impõe.
No período do regime policial, burocrático e militarizado de Stálin, a situação se torna explicitamente cesária: O chefe agora é um General que tem toda a autoridade, porque comanda a defesa da nação contra invasores. A Russia estava sendo atacada, sem ter ameaçado nenhum país.
2.3.1. Ora, mesmo que uma revolução do tipo leninista seja assumida por líderes neste modo cesáreo (Mao na China, Fidel e Khadafi], com tempo, ela deverá ser capaz de trazer uma Regência para a nação, não importando se ao modo monárquico ou republicano.
O Princípio de Regência aqui será ato-de-vontade, direção, conhecimento. Assim como é para os socialistas utópicos o planejamento da produção, das cooperativas, redistribuição, emissão estatal da moeda, etc.
Um regime hipoteticamente comunista, em que a igualdade entre todos os cidadãos seja intencionada, permanece necessitando determinar seu modo, ou princípio de regência, não importa se aristocrático, republicano, ou principado.
Na maioria das vezes os regimes socialistas se pretendem como Repúblicas.
Francia 714
3. Termos Críticos e Teóricos:
3.1. Um Princípio de Regência pode ser reconhecido, não importa se como resultado de uma guerra-civil entre as classes, ou se como resultado de um acordo-de-classes.
3.2. No Marxismo o termo “luta-de-classes” se tornou hiperbólico. A princípio teríamos um “conflito de interesses entre as classes”.
3.3. Seja como república ou principado, um regime do tipo soviético deve ter sua emergência planejando a produção, e fazendo o acordo entre as classes.
Ou, da mesma forma, um regime que fosse resultado de um tipo pacífico, cristão e utópico de “democracia”. Este regime teria que definir sua regência: não apenas no modo de governo, mas na forma do Estado, seus rituais, as lideranças, e sobre quais seriam as instruções cívicas do povo, das classes médias, etc.
O acordo entre as classes não seria de fato o “igualitarismo” social, sendo muito mais um acerto de compensações para as “diferenças sociais”. Ou seja, as diferenças como afirmações de especialidades e qualidades – não como “diferenças opressivas”, etc.
3.4. Todas as formas de repúblicas falharam nos séculos XIX e XX: as de base política liberal-burguesa, e burguesa-capitalista; de base popular-democrática, ou social-democrática; ou a república soviética.
3.4.1. A definição de Liberalismo se perdeu no século XX: Os autores Liberais do séc. XVIII desejavam justamente uma República que concedesse a seus Concidadãos todos seus direitos. Isso significava proteger os cidadãos dos abusos de autoridade monárquica/aristocrática. Da mesma forma de abusos econômicos: proteger os pobres contra os ricos.
O sentido de Liberal, assim, não apenas não é o atual “neo-liberal”, como na verdade é antagônico a este sentido de “capitalismo generalizado”. Tradições “de Esquerda” apressadamente atribuem aos Liberais epítetos de “Direita”.
3.4.2. Como “Direita”, podemos ter a “Direita Moderada” ou Conservadora, que quer retardar as reformas sociais, porque afirma “o povo não está preparado”... Porém se utiliza de esquemas fisiológicos, e não da violência verbal. Já a “Direita Reacionária” é diferente: apelo verbal à violência e aos militares, à ação política, intensificando o conflito de classes. Já a “Direita Fascista”, são reacionários que decidiram pegar em armas, eles mesmos, para instaurar sua ditadura anti-popular.
3.4.3. Como “Esquerda” nós temos os Utópicos do séc. XIX, que acreditavam nas reformas benevolentes. A Esquerda Reformista, ou Social-Democrata, está mais preocupada com a organização e educação das massas, com mais ou menos conflitos no âmbito republicano. Porém, o que realmente importa é o estabelecimento de uma República que Planeja a Produção, que detém ou controla as indústrias, e que controla a emissão da moeda, e impede o parasitismo financeiro.
A noção de “Social-Democracia”, entretanto, foi associada àquelas práticas que defendem as reformas sociais, porém sem jamais atingir o Estado Socialista, capaz de planejar a produção. Esta concepção, nos casos iniciais históricos, foi injusta (como no caso da dedicada atuação de Karl Kautski nos anos 90): [a]
A “Esquerda Bolchevique” (Leninista) supõe que o Estado Socialista somente poderia ser alcançado com revolução popular, com apoio de sindicatos, e dos soldados.
3.4.4. Nesse sentido, os Liberais seriam o verdadeiro “Centro”. Porém, os Centristas por sua vez, podem ser meros oportunistas, fisiológicos... Ou serem líderes políticos atuantes que se preocupam com o equilíbrio/harmonia dos poderes dentro da Nação.
[a] Podemos ler em G.D.Cole, History of Socialist Thought, 1957, London, Vol II, pag. 434:
Este é, assim, o Programa de Erfurt que os social-democratas alemães delinearam [1891, com a liderança Karl Kautski], se acreditando como marxistas sinceros, na aurora de sua recuperação da liberdade de propaganda, havendo sido repelidas as Leis Anti-Socialistas. Eles tiveram a assistência de Engels para a formulação de seu Programa, e o seu suporte político entusiástico, com sua preparação final. Em 1895 ... Engels escreveu sobre o P.S.D. alemão e seus dois milhões de eleitores como sendo
- a massa mais numerosa, mais compacta, a força-de-choque decisiva do exército proletário internacional -
Ele escreveu entusiasticamente acerca do excelente uso que o Partido havia feito do sufrágio universal, e contemplava cheio de expectativas o tempo em que eles teriam o suporte não meramente de um-quarto, mas de uma nítida maioria dos eleitores. Na mesma passagem ele deu ênfase às grandes mudanças que haviam ocorrido desde 1848 para a possibilidade de insurreições bem-sucedidas. Todas essas mudanças, ele dizia, tinham sido em favor dos militares, e contra os rebeldes, de modo que levantes não mais asseguravam, salvo sob circunstâncias muito excepcionais, qualquer chance de sucesso. Ele também dizia que os social-democratas alemães tinham demonstrado na prática que uma utilização maior poderia ser feita, das instituições de um governo constitucional capitalista, do que parecia possível em 1848, para avançar a causa dos trabalhadores...
[veja em apostila O Histórico-Antropológico]
3.5. Nos anos 20 na Alemanha, e nos anos 50 no Brasil, uma república liberal e reformista era desejada, e estava plenamente se formando entre as lideranças. Nos dois casos, as repúblicas, que deveriam desfrutar de estabilidade, e participação consciente dos cidadãos, foram destronadas por golpes de estado baseados em intrigas e propaganda, patrocinadas por espionagem e serviços de inteligência imperialistas internacionais.
3.6. Em todos os casos, os apelos à “democracia”, ou “igualdade”, “legalidade”, ou mesmo “fraternidade”, etc, apenas obscurecem o fato de que a cada vez todos desejam ter sua definição de República.
Entretanto, em todos nossos partidos, sejam os liberais (sentido estrito), ou reformistas, social-democratas, populares e socialistas, a reiteração do termo “democracia” apenas sugere a falta de definição real de um conjunto republicano.
3.6.1. A questão das lideranças e de seus programas é que está em relevo. Não a questão da “participação popular”. O tempo necessário para que o povo tenha consciência republicana adequada é muito longo ainda.
Portanto, são as regências, isto é, os jogos de liderança, que deveriam estar em primeiro lugar.
3.7. De um modo geral a Dialética da História seria a de que uma ordem social inicialmente cívica e solidária, daria nascimento a um Estado. Esse Estado se tornaria a academia política da nação, onde os líderes apresentam governâncias que, ao longo do tempo, fariam a formação política e participativa de todo o povo.
obs - Coimbra em 1064, não em 1109
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